Monday, April 29, 2019

LARGE



"Of small sands
of small seas
small minds are made.
Not all men
are matched in wisdom
the imperfect are easy to find."


Hávamál - the sayings of the Vikings, trad. Björn Jónasson, Reykjavik-Göteborg-Oslo: Gudrun, 1992, p. 68. 

Sunday, April 28, 2019

DIFÍCIL


"Mas o verdadeiro silêncio, que ainda é maior, e mais difícil de atingir, que o silêncio material, de que nos fala Carlyle, não é um daqueles deuses que podem abandonar os homens. Cerca-nos de todos os lados, é o fundo da nossa existência subentendida; e, desde que em nós bata, tremendo, a uma das portas do abismo, é sempre o mesmo silêncio que vem, atento, abrir essa porta."

Maurice Maeterlinck, O Tesoiro dos Humildes, trad. Cândido de Figueiredo, Lisboa: Livraria Clássica Editora, 1918, p. 14. 

Saturday, April 27, 2019

PENSAMENTOS


"Cattle die
Kinsmen die
all men are mortal.
Words of praise
will never perish
nor a noble name."


Hávamál - the sayings of the Vikings, trad. Björn Jónasson, Reykjavik-Göteborg-Oslo: Gudrun, 1992, p. 88. 

Friday, April 26, 2019

NATURALISMO




" - Mas esta criança não gosta de mim! - teimava Caetano.
- E ele a dar-lhe e o demo a fugir! - replicava pela centésima vez a dispenseira. - Um menino de três anos sabe lá o que é ser filho?...
- Devia adivinhar-me!
- Ora essa, queira-me perdoar, mas não me parece da cabeça de um senhor que teve estudos. Os filhos sabem lá quem são os pais! A gente é como os brutos. Uma vaca apartada do bezerro que botou cá fora nunca mais o conhece; os cães e os pássaros é tudo o mesmo. 
- Mas nós não somos cães nem pássaros, senhora Domingas - replicou o fidalgo, menos mau naturalista."


Camilo Castelo Branco, Mistérios de Fafe, 7.ª ed. Lisboa: Parceria António Maria Pereira, 1929, p. 108 [ort. atual.].

Thursday, April 25, 2019

CLASSIFICATÓRIA



"A classificação dos ventos que os meteorologistas nos propõem é simples mas prática. A poesia atribui aos ventos características ou traços masculinos ou femininos, eróticos, sedutores, divinos ou demoníacos, coléricos ou travessos, acariciadores, musicais, dos que provocam dores de cabeça ou fazem ver a vida cor-de-rosa, dos que nos inspiram ou que imitam as nossas inspirações (aqui, infelizmente, entrou a poesia de género menor). Dantes, todas as epopeias punham em cena uma grande tempestade no mar; os ventos eram as divindades do Mediterrâneo."

Pedrag Matvejevitch, Breviário Mediterrânico, trad. Pedro Tamen, Lisboa: Quetzal, 2019, p. 42. 

Wednesday, April 24, 2019

VIAJAR




"He is truly wise
who's travelled far
and knows the ways of the world. 
He who has travelled
can tell what spirit
governs the men he meets."


Hávamál - the sayings of the Vikings, trad. Björn Jónasson, Reykjavik-Göteborg-Oslo: Gudrun, 1992, p. 33. 

Tuesday, April 23, 2019

O QUE RESTA



"Viramo-nos todos para a Grécia e todos nós a consideramos, uns mais, outros menos, como nossa pátria. A Grécia não pertence a toda a gente. Não está inteiramente sobre o mar, como alguns imaginam: também possui montanhas, de píncaros nevados. O mar banha-lhe as costas, penetra nelas, mas não com a mesma profundidade em toda a parte, e nem sempre da mesma maneira. As praias e o mar são ainda como eram antigamente; as ilhas são as de outrora, as Cíclades e as Espórades, o mar Jónico e o mar Egeu, cada qual do seu lado; o céu continua a ter a mesma coloração. E, no entanto, o passado não regressa, nem se reproduz: a Grécia e a Grande Grécia separaram-se há muito, a Hélade e Bizâncio desuniram-se para sempre; Bizâncio e o Império do Oriente nunca mais se encontraram. Estas ruturas foram dolorosas e profundas, as perdas em terra aumentaram no mar: de cada vez, era sempre preciso perguntar o que restava do que antes existia. Os próprios gregos interrogavam se lhes restava algo com que continuar, ir em frente ou recomeçar. O destino do Mediterrâneo confunde-se assim com o da Grécia."

Pedrag Matvejevitch, Breviário Mediterrânico, trad. Pedro Tamen, Lisboa: Quetzal, 2019, p. 109. 

Monday, April 22, 2019

OLIMPO



"CORO - Infinitas são as manifestações da vontade divina; infinitos os acontecimentos que os deuses desencadeiam contra o que tínhamos previsto. Os que esperamos, esses não se realizam; os que não esperamos, um deus lhes abre o caminho."

Eurípides, As Bacantes, trad. Fernando Melro, 2ª ed., Lisboa: Ed. Inquérito, p. 91. 

Friday, April 19, 2019

PARASCEVE


"O castigo aproxima-se. Se eles fazem isto ao lenho verde, o que não se fará ao seco? O Lenho Verde é a árvore ainda viva, ligada pelas raízes à terra fresca, e que recebe a chuva nas suas folhas e os pássaros nos seus ramos; é a árvore que dá flor sob o Sol e o sopro do vento. É a boa planta que dá sombra ao peregrino, frutos ao faminto e lenha a quem tem frio. É o símbolo do Santo que a todos distribui os seus dons e que possui, dentro do corpo endurecido, uma alma viva."

Giovanni Papini, História de Cristo, trad. Francisco Costa, Lisboa: Livros do Brasil, 2006, p. 350. 

Thursday, April 18, 2019

DELPHICA 2



"De novo em Delphos o Python emerge 
Do sono sob os séculos contido
As águias afastaram o seu voo
Só as abelhas zumbem ainda no flanco da montanha seu vozear de bronze
Sob negras nuvens e mórbidos estios o Phyton emerge
A ordem natural do divino é deslocada
De novo cresce o poder do monstruoso
De novo cresce o poder do «Apodrecido»
De novo o corpo de Python é reunido
Nenhum deus respira no respirar das coisas
As máquinas crescem o Python emerge
Sob o húmido interior da terra movem-se devagar os seus anéis
Ventos da Ásia em sua boca trazem 
O estridente clamor da fúria tantra
Tudo vai rolar na violência do instante
Nenhuma coisa é construída em pedra"


Sophia de Mello Breyner Andresen, Dual, Lisboa: Editorial Caminho, 2004, p. 24. 

Tuesday, April 16, 2019

DELPHICA 1



"Tua face taurina tua testa baixa
Teus cabelos em anel que sacudias como crina
Teu torso inchado de ar como uma vela
Teu queixo redondo tua boca pesada
Tua pesada beleza
Teu meio-dia nocturno
Tua herança dos deuses que no Nilo afogaste
Tua unidade inteira com teu corpo
Num silêncio de sol obstinado
Agora são de pedra no museu de Delphos
Onde as montanhas te rodeiam como incenso
Entre o austero Auriga e a arquitrave quebrada."


Sophia de Mello Breyner Andresen, Dual, Lisboa: Editorial Caminho, 2004, p. 23. 

Monday, April 15, 2019

EXPOSTOS




"Jovens sorridentes celebrando
Em todos os museus a própria morte

Tão direito e firme amor da vida
Aqueles que os amaram consagrando
A breve eternidade do seu povo. 

Agora expostos numa terra alheia
De seus ossos e cinzas separados
Roubados ao lugar que os viu viver
O entreaberto lírio do sorriso
As passagens sem luz iluminando"


Sophia de Mello Breyner Andresen, Ilhas, 4ªed., Lisboa: Caminho, 2004, p. 62. 

Sunday, April 14, 2019

PRESIDIR





"Claro e esguiamente medido como a amphora
Como a amphora
Ele contém um vinho intenso e resinado
A lucidez da sua forma oculta a embrigaguez
A sua claridade conduz-nos ao encontro da noite
A sua rectidão de coluna preside à imanência dos desastres"


Sophia de Mello Breyner Andresen, Dual, Lisboa: Editorial Caminho, 2004, p. 62.

ENTRADA




"As aparências do Mediterrâneo têm também o seu papel a desempenhar. A especificidade da sua posição e a homogeneidade do seu espaço provocam a impressão de que ele é um mundo em si mesmo e o centro do mundo: mar enquadrado por terra, terra rodeada de mar. O Sol que sobre ele se ergue e profusamente o ilumina parece estar no céu só por causa dele e só a ele pertencer. (Os cosmógrafos e os geógrafos da Antiguidade transmitiram algo desta divagação nas suas teorias e exprimiram-na nas suas cartas.) A influência dos raios solares dá lugar a certos fenómenos psicológicos, efémeros e persistentes. A vastidão e a limpidez dos céus suscitam acaso estados místicos e despertam o temor do além. O Mediterrâneo erigiu monumentos à fé e à superstição, à grandeza e à vaidade."

Pedrag Matvejevitch, Breviário Mediterrânico, trad. Pedro Tamen, Lisboa: Quetzal, 2019, p. 25. 

Saturday, April 13, 2019

PSICOPOMPO


"Pois bem: a realidade que realmente não tem cor, nem rosto, e se mantém intangível: aquela cuja visão só é proporcionada ao condutor da alma pelo intelecto."

Platão, Fedro, 247c, trad. Pinharanda Gomes, 6ª ed., Lisboa: Guimarães Editores, 2000, p. 61.

Friday, April 12, 2019

O DOLO





"«Ai, pobre de mim! Será de novo um dos imortais a tecer
um dolo, dizendo-me para abandonar a jangada?
Mas não me deixarei ainda convencer, pois longe está
a terra que vi com os olhos, onde ela disse que me salvaria.»"


Homero, Odisseia, V, 356-359, trad. Frederico Lourenço, Lisboa: Biblioteca Editores Independentes/Cotovia, 2010 (reimpr.), p. 101. 

Wednesday, April 10, 2019

ANIVERSÁRIO






"A árvore foi a forma de te ver
E desci para abrir a casa.
De me teres visitado e avistado
Entre os ramos
Fizeste-me passagem
Da folha ao voo do pássaro
Do sol à doçura do fruto.
Para me encontrares me deste
A pequenez."


Daniel Faria, Poesia, 2ª ed., ed. Vera Vouga, Lisboa: Assírio & Alvim, 2015, p. 166. 

Tuesday, April 9, 2019

APRESSAR




"Assim falou; e não lhe desobedeceu Hera, a deusa dos alvos braços,
mas dirigiu-se das montanhas do Ida ao alto Olimpo. 
E tal como se apressa o pensamento do homem, que atravessou
vasta extensão de terra e assim pensa no seu espírito experiente
«quem me dera estar aqui, ou ali», formulando muitos desejos - 
assim rapidamente se apressou com afinco a excelsa Hera."


Homero, Ilíada, XV, 78-83, trad. Frederico Lourenço, Lisboa: Cotovia, 2009 [reimp.], p.300. 

Monday, April 8, 2019

IDÍLIOS




"Em resumo: passei a transportar essa árvore na algibeira (cabia lá, garanto-vos!) para a colocar onde me conviesse, sem pedir licença à Musa, que trago sempre a meu lado de sentinela: nas mesas dos cafés, na sala de espera dos dentistas, naquela nuvem, nas conferência de bocejo respeitoso... Uma árvore estranha para idílios e tempestades com braços animais e movediços que ora se cobriam de flores ora de ventosas de sanguessugas.
Uma árvore com um sol enforcado ou uma ave suicida, conforme as urgências da Poesia..."


José Gomes Ferreira, A Memória das Palavras, 5.ª ed., Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1991, p. 60. 

Sunday, April 7, 2019

O FILHO DO HOMEM



"Resta a outra profecia, a segunda. Quando voltará o Filho do Homem sobre a nuvem do Céu, precedido pelas trevas e anunciado pelas trombetas dos anjos? Ninguém, disse Jesus, pode dizer qual é o dia da sua vinda. O Filho do Homem é comparado ao relâmpago que salta num momento do nascente ao poente; ao ladrão que vem furtivamente de noite; ao amo que se afastou para longe e volta inesperadamente para surpreender os seus servidores. Deveis estar vigiantes e preparados."

Giovanni Papini, História de Cristo, trad. Francisco Costa, Lisboa: Livros do Brasil, 2006, p. 267. 

Saturday, April 6, 2019

QUANTO MAIS




"Naquele tempo havia uma árvore solitária, uma cerejeira solitária, uma árvore solitária,
que bebia na margem do rio Eufrates. 
A fúria do suão arrancou-a pela raiz e amputou-a de ramos, 
o Eufrates sobre ela as vagas precipitou.
Uma mulher, devota da palavra de An, 
uma mulher, devota da palavra de Enlil, 
recolheu-a com as suas mãos e levou-a a Unug, 
para o sagrado jardim de Innana a levou.
A mulher não plantou a árvore com as mãos, plantou-a com os pés, 
a mulher não irrigou a árvore com as mãos, irrigou-a com os pés.
Disse ela: «Quanto mais até ser um trono esplendoroso em que me possa sentar?»
Disse ela: «Quanto mais até ser um puro leito em que me possa deitar?»
Antes de cinco anos, [dez anos transcorreram,]
tanto a árvore espessara, nem o córtice podia fender-se.
Nas raízes, uma Serpente-Que-Ignora-Esconjuros fizera o seu ninho, 
nos ramos, o pássaro de Anzu chocara a sua ninhada, 
no tronco, um Súcubo edificara a sua casa. 
A donzela que ri de coração cheio, 
a sagrada Innana, como chorava ela!"


Épico de Gilgames, tábua XII, trad. Francisco Luís Parreira, Lisboa: Assírio & Alvim, 2017, p.  158. 

Friday, April 5, 2019

TORMENTA



"Durante seis dias e sete noites
uivaram os ventos; as chuvadas, 
os vendavais, o Dilúvio - devastaram a terra.
Mas, ao chegar o sétimo dia, [destroçada a terra, 
o furacão belicoso] amainou, o Dilúvio cessou.
O oceano, que esbravejara como a mulher que dá à luz, 
sossegava, a tormenta apaziguava, findava o Dilúvio.
Contemplei os céus, montava a calmaria, 
mas a humanidade fora reduzida a argila.
A paisagem era plana como uma campa rasa."


Épico de Gilgames, tábua XI, trad. Francisco Luís Parreira, Lisboa: Assírio & Alvim, 2017, p. 147. 

Thursday, April 4, 2019

CATÁBASE




"Disse Gilgames, a ele, ao guerreiro Samas:
«Após cruzar, após esgotar estas desolações, 
descido ao Mundo Inferior, terei por pouco o descanso?
Lá, terei a eternidade toda para dormir!
Que os meus olhos vejam o sol e eu me sacie de luz!
A que distância estão as trevas e quanta luz há nelas?
Alguma vez poderão os mortos banhar-se nos raios do sol?»"


Épico de Gilgames, tábua IX, trad. Francisco Luís Parreira, Lisboa: Assírio & Alvim, 2017, pp. 123-124. 

Wednesday, April 3, 2019

PORTA



"Enkidu ergueu [os olhos, fitando a porta,]
e para a porta falou como se fora humana:
«Ó tu, porta das florestas, privada de sentido, 
desluzida de entendimento, ao contrário de mim.»"


Épico de Gilgames, tábua VII, trad. Francisco Luís Parreira, Lisboa: Assírio & Alvim, 2017, p. 107. 

Tuesday, April 2, 2019

SAMAS



"Samas, lá dos céus, retorquiu:
«Jovem, tu em tua casa és um amo, mas na montanha serás o quê?»
«Ó Samas, deixa-me dizer-to, presta atenção às minhas palavras!
Deixa-me dizer-to, queiras tu meditá-lo!
Na minha cidade, morre um homem e o coração aflige-se, 
perece um homem e o coração enche-se de dor. 
Fui ao cimo da muralha e estiquei o pescoço, 
o meu olhar foi cair sobre um cadáver que ia rio abaixo, flutuando nas águas:
também eu serei assim, assim mesmo serei eu!
"Nenhum homem, por alto que seja, pode alcandorar-se ao céu, 
nenhum homem, por amplo que seja, pode abraçar a montanha!"


Épico de Gilgames, tábua II, trad. Francisco Luís Parreira, Lisboa: Assírio & Alvim, 2017, p. 63. 

Monday, April 1, 2019

PERMEÁVEL



"Entrou pela noite, solícito, 
uma folha per-
meável às estrelas
no lugar da boca: 
resta ainda
alguma coisa a desfazer sem freio
ao encontro das árvores."



Paul Celan, Sete Rosas Mais Tarde - Antologia Poética, trad. João Barrento e Y. K. Centeno, 2.ª ed., Lisboa: Ed. Cotovia, 1996, pp. 149; 151.