Wednesday, May 6, 2009

E HÁ JANELAS QUE NÃO SE ENCERRAM À ESCURIDÃO


"XLIX

Metto-me para dentro, e fecho a janella.
Trazem o candieiro e dão as boas-noites,
E a minha voz contente dá as boas-noites.
Oxalá a minha vida seja sempre isto:
O dia cheio de sol, ou suave de chuva,
Ou tempestuoso como se acabasse o mundo,
A tarde suave e os ranchos que passam
Fitados com interesse da janella,
O ultimo olhar amigo dado ao socego das arvores,
E depois, fechada a janela, o candieiro acceso,
Sem ler nada, nem pensar em nada, nem dormir,
Sentir a vida correr por mim como um rio por seu leito,
E lá fóra um grande silencio como um deus que dorme."


Fernando Pessoa (Alberto Caeiro), Poemas Completos de Alberto Caeiro, recolha, transcrição e notas de Teresa Sobral Cunha, Lisboa: Editorial Presença, 1994, p. 100.

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