Saturday, May 11, 2013

COMÉRCIO


"Depois duma argumentação tão sólida, Chichikov convenceu-se de que tinha ganho a sua causa.
- Realmente - respondeu a senhora - eu não sou mais que uma pobre viúva sem experiência. Prefiro esperar algum tempo. É natural que apareçam por aí outros compradores e confrontarei preços.
- Olha! olha! Pobre criatura! Parece mentira que a senhora diga semelhante coisa! Reflita um pouco. Quem quererá fazer um embarque de mortos? Para que lhe podem servir?
- Quem sabe? Para os trabalhos do campo, talvez... - objectou a velha que, sem terminar a frase, ficou de boca aberta, olhando para Chichikov, à espera do que este lhe responderia.
- Com que então pensa a senhora em empregá-los a espantar, pela noite, os pardais da sua horta!...
- Deus nos acuda! Sempre diz cada horror! - exclamou a velha, benzendo-se.
- Então que pretende a senhora fazer com eles? Por outro lado: ossadas e tumbas, tudo ficará com a senhora; a transferência só se fará no papel. Quer assim? Estamos de acordo? Vamos, responda!"
  Nicolau Gogol, As Almas Mortas (Aventuras de Chichikov), trad. Isolino Caramalho, Lisboa: Editorial «Gleba», 1945, p. 59.

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