Monday, February 6, 2017

BARLEYCORNER




"O bêbedo ordinário rola facilmente para a valeta, mas que terrível provação para o outro, sustentando-se direito, bem seguro em ambas as pernas, e a concluir que em todo o universo só existe para ele uma única liberdade: a de apressar o dia da sua morte! Para um tal homem, essa hora é a da razão pura (de que falaremos noutro lugar), em que ele sabe que só pode conhecer a lei das coisas - nunca a sua significação. Hora perigosa, durante a qual os seus pés se firmam no caminho que conduz ao túmulo. 
Tudo é nítido aos seus olhos. Todas as suas ascensões ilusórias para a imortalidade não são mais que os terrores de almas dominadas pela ideia da morte, e três vezes malditas pelo poder de imaginação. Elas não possuem o instinto da passagem para a morte; falta-lhes a vontade de morrer quando a hora soa para elas. Iludem-se a si próprias querendo enganar a morte para ganhar um futuro pessoal, abandonando os outros animais às trevas do túmulo ou ao ardor devorador do forno crematório. Mas o nosso homem, nesse momento em que julga friamente as coisas, sabe que essas almas são logradas e o são por elas próprias. O fim é igual para todos. Não há nada de novo sob o Sol, nem sequer essa puerilidade pela qual suspiram as almas fracas: a imortalidade."


Jack London, Memórias de um Bebedor, trad. Campos Lima, Lisboa: Editorial Inquérito, s.d., pp. 36-37. 

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