Tuesday, December 19, 2017

SERVIR



"«A linguagem serve para produzir uma mensagem, que só ganha sentido na medida em que há um destinatário. Eu falo-vos neste momento, vós sois a razão de ser do meu discurso. Só os loucos falam no deserto. O louco ao menos fala para si mesmo. Mas um texto, para quem fala ele? Para toda a gente! Logo, para ninguém. Quando uma vez por todas fica escrito, cada discurso passa indiferentemente junto dos que o conhecem como dos que nada têm a ver com ele, sem saber quais são aqueles a quem deve ou não dirigir-se. Um texto que não tem destinatário preciso é uma garantia de imprecisão, alegações vagas e impessoais. Como poderia uma mensagem convir a toda a gente? Mesmo uma carta é inferior a qualquer conversa: é escrita num certo contexto, é recebida noutro. Aliás, mais tarde, a situação do autor e a do destinatário mudaram. Ela é já obsoleta, dirigia-se a alguém que já não existe, e o seu autor não existe tampouco, desaparecido no poço do tempo, mal se fechou o envelope.»"


Laurent Binet, A Sétima Função da Linguagem, trad. Antonio Sabler, Lisboa: Quetzal, 2017, p. 186. 

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