Saturday, May 30, 2015

OS RELÓGIOS DO DR. MABUSE



"Voltou a tomar cocaína?
Um dia
hei-de tomar um quilo de platina
quando sigo o teu caminho. 
Compro! Vendo!
O meu clube
cabeça de jovem milionário
alguns milhões entrando o Avenida
Palace.

Boa-noite Senhor Hull!
Sem dinheiro sem crisântemos a
juventude pouco vale.
O ás de ouros
traz as datas de fevereiro
pétalas de alegria. 
Porque não jogas?

O espelho leva a outro espelho.
Fiquemo-nos por aqui
pelas horas da vida

levando a senha noite fora «Mirabeau»
«Diderot» «Rousseau» essa gente. 
Os espíritos surgem
são o destino dos homens e 
a traição o jogo do lugar. 

A vontade. Os relógios. 
Um jardim de outras aves. 
O relógio entre fumos e irmãos de arte
é o corpo a meio da cidade. 
Não há capicua para esta sorte. 

A morte resolve ainda menos. 
O teu rosto
ao próprio rosto
ao espelho do teu rosto eu quero dar. 
Era uma noite."


João Miguel Fernandes Jorge, "Actus Tragicus", in Obra Poética, vol. 4, 2ª ed., Lisboa: Editorial Presença, 1991, p. 96. 

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