Monday, March 28, 2011

DOS MISTÉRIOS



"E Monelle estendeu-me um castiçal em que ardia um filamento cor-de-rosa.
- Toma este archote - disse ela, - e deixa arder. Deixa queimar tudo na terra e no céu. E quebra o castiçal e apaga-o quando tiveres deixado arder tudo, porque nada se deve transmitir.
Para que tu sejas o segundo nartecóforo e destruas pelo fogo e que o fogo descido dos céus torne a subir aos céus.
E Monelle disse também: Vou falar-te da destruição.

É esta a palavra: destrói, destrói, destrói. Destrói em ti mesmo, destrói à tua volta. Abre lugar para a tua alma e para as outras almas.
Destrói todo o bem e todo o mal. Os escombros são iguais.
Destrói as antigas habitações dos homens e as antigas habitações das almas; as coisas mortas são espelhos que deformam. Destrói, porque toda a criação provém da destruição.
E para haver a bondade superior tem de se aniquilar a bondade inferior. E assim o novo bem surge saturado do mal.
E para imaginar uma nova arte, tem de se destruir a arte antiga. E assim a arte nova parece uma espécie de iconoclasia.
Porque toda a construção é feita de ruínas, e não há nada novo neste mundo além das formas.
Mas temos de destruir as formas."

Marcel Schwob, O livro de Monelle, trad. Helena Moura e José Colaço Barreiros, Lisboa: Teorema, 1994, pp. 12-13.

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