"Se o zeloso clero das cercanias do Bom Jesus vertesse à letra o tout est plein d'âmes, e o livro, que tal afirma, não escapasse ao Index do sacro colégio, veríamos as florestas mansíssimas da montanha invadidas por exorcistas e pelo machado, modos sabidos de afugentar almas das árvores. O grande poeta queria dizer que as árvores têm vozes misteriosas, e os corações audição interior que as escuta, e o entendimento lucidez que as compreende. Não me parece que ele quisesse denunciar à liturgia demonográfica legiões de almas penadas, daninhas à silvicultura. Deixemos dizer o poeta o que nós ignoramos, e deixemos também que as formosas romeiras do Bom Jesus se entendam com os espíritos da soledade, vestido das matizes da iriada borboleta, ou coruscantes na flor orvalhada com que brincam os primeiros raios de sol."
Camilo Castelo Branco, No Bom Jesus do Monte, 4ª ed., Porto: Livraria Chardron/Lello, s.d., pp. 5-6.
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