"Sempre gostara de paisagens solitárias: grandes praias desertas sem outras pegadas que não fossem as suas - que poderio! - os longos horizontes da planície, as cidades àquela hora mansa, e levemente angustiada também, em que as pessoas dormem ou chamam laboriosamente por um sono que se lhes recusa. Agora, porém, esses velhos quadros entrevistos pareciam-lhe grosseiras, terrestres imitações daquela solidão impoluta, tão grande e tão perfeita, que estava a atravessar. Para além da dupla vidraça tudo era possível, até a branca, suave mão de um Deus protector a avançar para ele. Até um pouco de ectoplasma vagabundo. Até o anjo da morte, até esse. Coisas vulgares, prováveis, não!"
Maria Judite de Carvalho, "As Palavras Poupadas", in Obras Completas, vol. I, Lisboa: Minotauro, 2021, p. 233.
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