Friday, January 5, 2024

QUEBRADIÇO

 


"Apanhava um punhado de argila, com ela me deliciava modelando um boizinho ou um pardal. E afilava as patas ou torcia as asas, e alongava os chifres ou aguçava o bico. À medida que iam ficando completos, alinhados sobre uma pedra-de-mó, o colorido neles naturalmente nascia. E era lustroso e cobreado aquele boi, pardo e doirado o tal pardalito. De repente, a um sopro meu, uma vida palpitante neles vinha alojar-se. Movia-se o boi, na campina onde pastava, esvoaçava o pardal, para longo do espantalho que o bania. Do barro, onde os arrancava, a natureza quebradiça conservavam, porém, e iniciavam a vida, com um resto de tremor nos olhos amortecidos."

Mário Cláudio, A Fuga para o Egipto, Lisboa: Quetzal, 1987, p. 69. 

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