"Tinha as tristezas do talento que se acha excluído das condições materiais do interesse. O pai via um equivalente a dinheiro nos lavores do filho; o artista, sonhando as vagas ovações da glória, via em redor de si o riso desdenhoso da inveja e o estipêndio regateado do trabalho. Escondia-se para não ver passar às mãos de um frio possuidor de baixela a sua obra, que levava mais amor do seu coração que primores do escopro. Pungiam-lhe então o espírito violentas ambições de riqueza. Queria sagrar a sua arte esquivando-se à prostituição do dinheiro; fechar-se com as suas criações, fazê-las símbolos da sua vida obscura num mundo cheio de luz, espelhar na lâmina de ouro e prata a sua alma, rever-se nas suas obras quando baixasse ao poente da vida e legá-las para um alto espírito que uma vez encontrasse a procurar em vão ao vazio das alegrias humanas o trabalho como refúgio, e as lágrimas ignoradas como consolação."
Camilo Castelo Branco, A Viúva do Enforcado, Porto: Book Cover Editora, 2021, p. 14.
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