"Fui feliz. O meu nome deve ter dito rua da Felicidade. Hoje, deveria chamar-me rua do Paraíso Perdido. A morte do barco, assassinado, à minha vista, pela locomotiva; a paragem desta, numa estação esquálida, a meia légua de mim; o desvia de uma estrada, cujo fito, creio eu, não foi servir os povos, foi chegar à tumba sem sair do berço; por último, a gasolina, que pulverizou, pelas aldeias, os centros comerciais... Todos esses bens foram para mim o mal. Deram cabo de mim. A morte, por sua vez, há-de fazer o resto. Por esta fenda, se me irá a vida. Suporto, há século e meio, nas minhas costas, o peso dum grande morro. Mais dia, menos dia, há-de esbarrondar-se... Irão comigo, para o abismo, os bêbedos que me habitam - os meus últimos amigos. Como lhes quero bem... O desmazelo desses rapazes é o toldado buqué da minha vida. Lembra-me o sossego de alma, que foi, no tempo áureo, o prémio da minha energia."
João de Araújo Correia, Caminho de Consortes, 2.ª ed., Régua: Imprensa do Douro, 1971, pp. 78-79.
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