"O mal (o bem) é que todos morremos
demasiado cedo.
A morte é algo que acontece sempre
aos outros e antes do tempo.
Não há nada, de facto, que a apague.
Quando se chega lá,
já é demasiado tarde -
no hospital,
na maca,
inadvertidamente ao acaso
de um lençol levantado.
A morte é a morte,
sempre tautológica.
Nela, os vivos (os mortos) sempre se equivalem
e a morte, a ela, nada há
que a figure verdadeiramente.
Também quem este poema escreveu
já morreu.
Este é mesmo o poema do seu enterro.
Felizmente que era belga.
Contentava-se com pouco:
um pouco de sol e de silêncio
na Grande Place, em Bruxelas,
com os vidros das janelas
a rebrilhar, por dentro.
Morre-se, mas a vida também é bela.
Mesmo em Bruxelas.
Ainda vale a pena vivê-la
e escrever mesmo, de vez em quando,
um poema. Como este.
Um poema que se dispa
como um sobretudo
e como um rio corra,
indiferente a tudo,
incontido e limpo."
Théodore Fraenckel [?], Iluminuras, Lisboa: douda correria, 2018.
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