Sunday, February 18, 2024

A VOZ

 




" - Abençoai-nos este dia sagrado, Senhor, abençoai-me a mim, ao Dylan e a esta Vossa pequena capela para todo o sempre, ámen. Fiz aqui uma série de melhoramentos.
Fiquei sentado no feno de olhos postos em Gwilym a pregar, e ouvi a voz dele subir, tornar-se rouca, baixar para um sussurro, desatar a cantar, passar para galês, vibrar triunfante, e soar ora irada ora humilde. O Sol através de um buraco iluminava-lhe os ombros suplicantes:
- Senhor, Vós que estais a todos o momento em toda a parte, no orvalho da manhã, na névoa do entardecer, no campo e na cidade, no pregador e no pecador, no pardal e no falcão enorme. Vós que podeis ver tudo, no mais fundo dos nossos corações; Vós que podeis ver-nos quando o Sol desapareceu; Vós que podeis ver-nos quando não há estrelas no céu, na espessa escuridão, no fundo dos fundos do mais profundo poço; Vós que podeis ver-nos e vigiar-nos e observar-nos a cada momento, nos cantos mais recônditos, nas vastas pradarias dos cowboys, debaixo dos lençóis, quando ressonamos no sono; nas sombras mais terríveis; nas trevas de breu, nas trevas de breu; Vós que podeis ver tudo o que fazemos, de noite e de dia, de dia e de noite, tudo, tudo; Vós que podeis ver tudo a cada momento. Ó Senhor, vá, Vós sois como o raio de um gato."



Dylan Thomas, "Os Pêssegos", in Oito Contos, trad. José Lima, Porto: Livros do Brasil, 2024, p. 35.

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