Wednesday, February 7, 2024

O LIMITE

 



"Mas, meu caro senhor, e era aqui que eu queria chegar, para responder à sua pergunta: os dois relojoeiros, que fabricaram as obras-primas de Lubeck e de Estrasburgo, morreram há já séculos, e, no entanto, os seus prodigiosos brinquedos não é por isso que deixam de continuar a indicar, sem jamais se enganarem, a hora, a altura das marés, os signos do Zodíaco e as fases da Lua. E agora, meu caro senhor, vou confiar-lhe o mais íntimo do meu pensamento, o terrível segredo que me desespera. Deus morreu. E nós vivemos no mecanismo que continua a dar-nos tudo o que a sua sabedoria imaginou de maravilhoso, enquanto durou o seu poder criador.
Os fiéis dos templos, das sinagogas, das igrejas, das mesquitas, admiram a sua sabedoria divina, porque vêem as flores da Primavera transformarem-se em frutos no Outono, e porque vêem as neves de Inverno dar lugar ao primeiro germinar do trigo. Veneram, admiram esse Deus, pela sabedoria revelada em cada flor e cada fruto, em cada gota de chuva e em cada raio de sol, mas ignoram a medonha verdade. Deus morreu, e o que acreditam ser a divindade, não passa do terrível mecanismo que subsiste depois da desaparição do seu criador.
Fatigado, Georges Olivier calou-se."



Maurice Sandoz, O Limite, s. trad., Lisboa: Editorial Organizações, 1957, pp. 120-121.

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