"O que será de ti quando eu deixar
esse planeta só na sua elipse
e me for às galáxias imperfeitas
ditar da criação o último eclipse.
Que outros corpos terão na tua sede
a fonte inacessível e primeira;
que gesto nunca antes concebido
trará ao mundo a terra verdadeira.
Não há no universo outra casa assim
habitada por bichos com ideias;
talvez em vez de gente melhor fôra
entregá-la ao descaso e ao proveito de uma etérea companhia.
A ti confio a feira; volte um dia,
e com asas nos pés esteja refeito
o divino baloiço das estrelas,
aprenderei contigo a impaciência
que em ti não use, para bem servir-te;
e então não serei mais, nos teus desenhos,
ausente das imagens e das paisagens,
o caracol que pousa na moldura;
e enfim no carrocel terei lugar seguro."
António Franco Alexandre, "Carrocel", in Poemas, Lisboa: Assírio & Alvim, 2021, p. 594.
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