"Eu tenho da vida uma sensação doente,
desarmonias moles, franjas espinais,
um rumor absurdo da visão insistente
de aranhas, répteis, moluscos, viscos animais.
Prendo as minhas impressões a um candeeiro.
A luz agarra-me, flutuo indecisamente
com alterações eléctricas, quebras de corrente,
e acendo uma vela, respiro fumo, um cheiro
a cera, a mortos, ao nevoeiro de velhos portos.
Ouço, ao longe, o motor de pesados cargueiros
ancorados no rio, instáveis, os mastros tortos,
e deito-me no sofá, com pulsações; salgueiros,
plátanos, pálidos abetos à neve, orquídeas,
a minhas respiração frágil como um busto de Fídias."
Nuno Júdice, Obra Poética (1972-1985). Lisboa: Quetzal Editores, 1991, p. 268.
No comments:
Post a Comment