"Dito de outra maneira, Deus é venerável, apesar da vida não ter sentido, apesar do injusto exibir os seus poderes na sede da justiça, apesar do opressor torturar o oprimido, tudo isto culminando no poder da morte eliminar qualquer distinção feita sob o sol (por exemplo, entre justo e injusto). Depois de mortos, nada feito, extravagância das extravagâncias, pois nós não podemos imaginar a nossa morte, ela é absolutamente irrepresentável. A única coisa que podemos dizer é que os mortos não sabem que estão mortos e que os vivos sabem que vão morrer. Portanto, de teologia não poderia falar. Mas, por aquilo que li no Qohélet, sei que ele não é um teólogo, é um sábio no sentido de um homem que procura não se deixa enganar (aplicando-lhe a qualificação que Colli usa para descrever os antigos sábios gregos antes de Sócrates). Porém, além de não se querer deixar enganar, Qohélet ama os prazeres da vida, o que, não contribuindo para o sentido da vida, intensifica o sentimento de estar vivo."
Maria Filomena Molder, Três Conferências. Primeira - Lança o teu pão sobre as águas (sobre o qohélet/ecclesiastes), Lisboa: edições do Saguão, 2021, pp. 28-29.
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