"Um fantasma ainda é como um lugar,
onde o teu olhar embate com um som;
mas aqui, nesta pele preta de afagar,
dissolve-se a tua mais forte visão:
como um doente que com acessos, quando está
no auge da sua fúria, bate os pés no escuro e
de repente se achasse num alcochoado seguro
de uma cela, onde parasse e se evaporasse de lá.
Todos os olhares que sobre ele pousaram
parece dentro de si fingir,
para sobre eles ameaçador e indisposto, porque ousaram,
se fechar num arrepio e com eles dormir.
Mas, como que desperto, volta subitamente
para ti o rosto e olha-te directamente:
e então encontras teu olhar no âmbar, sem folhos,
amarelo das pedras redondas dos seus olhos,
sem contar: fechado recinto
como um insecto extinto."
Rainer Maria Rilke, Novos Poemas, trad. Maria Teresa Dias Furtado, Lisboa: Assírio & Alvim, 2023, p. 189.
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