Monday, September 9, 2024

SOL

 


"Mas, se acreditares, só te peço uma coisa, não vejas nestes factos qualquer carácter simbólico, qualquer sentido para além deles. Os factos, nada mais querem significar, recuso-me a considerá-los substitutos de outra coisa, recuso-me a concluir que falar em A é uma forma de dizer B, que dizer pombas exprime paz. Um octógono é um octógono, não designa a eternidade. Um quadrado é um quadrado, não manifesta um sinal da terra. Um círculo é um círculo, não simboliza o céu. Por muito que isto pese a Carlos Magno e às suas pretensões de exprimir a missão do rei neste mundo através das igrejas de planta central. Das igrejas de planta central!
No presente texto diz-se somente o que se diz. Nada mais. Não vejam nele uma alegoria. Quando muito, uma alegoria que nada alegoriza. 
Já vai sendo tempo, julgo eu, de pôr de lado a ideia de que as coisas em vez de se designarem a si próprias, significam não sei quê. E Alberto Caeiro sabia-o. E também as palavras só se designam a si próprias, claro."


Augusto Abelaira, O Triunfo da Morte, Lisboa: Sá da Costa Editora, 1981, pp. 53-54. 

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