Monday, September 2, 2024

VASTA PLANÍCIE

 



"Durante o período de férias que o jovem foi autorizado a gozar em Progrody, o comerciante de corais quase não se afastou dele. O jovem achava estranhas as perguntas que o mais velho lhe fazia, como por exemplo:
«Pode-se ver o fundo do mar com o telescópio?»
«Não» - dizia o marinheiro - «com o telescópio vê-se apenas ao longe e não o fundo.»
«Pode um indivíduo» - continuava Nissen Piczenik a perguntar - «deixar-se cair até ao fundo do mar quando se é marinheiro?»
«Não» - dizia o jovem Komrower - «só quando se afoga é que se vai ao fundo do mar.»
«O capitão também não pode?»
«Também o capitão não pode.»
«Já viste alguma vez um mergulhador?»
«De vez em quando» - dizia o marinheiro.
«Os animais e as plantas do mar vêm às vezes à tona da água?»
«Apenas os peixes e as baleias, que na realidade não são peixes.»
«Descreve-me o mar» - dizia Nissen Piczenik.
«É uma imensidão de água» - dizia o marinheiro Komrower.
«E é tão vasto como um campo extenso, uma vasta planície por exemplo, em que não se vislumbra uma única casa?»
«É assim tão vasto - e ainda mais!» - dizia o jovem marinheiro."


Joseph Roth, O Leviatã, trad. Álvaro Gonçalves, Lisboa: Assírio & Alvim, 2001, pp. 37-38.

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