"Passou algo pelas feições de Joseph, que pareceram alterar-se de repente.
- Deus dá coragem - disse ele -, Deus dá tudo. Tu não fazes parte dos trocistas, tu nunca te sentaste no banco de que se fala no salmo I, mas ainda não crês em mim. Amas o Senhor em paz, mas eu tenho a fúria de Deus. Só posso amar com violência porque sou um homem de desejo. É por isso que estou mais exposto a perder a graça divina e de certo modo mais perto do Inferno do que tu nunca hás-de estar. Eu não sabes o que é o Inferno, mas eu, por mim, sei-o, porque sei o que é o fogo. O fogo é a minha pátria. Fui atirado, um dia, em criança, ao braseiro da presença de Deus, sei o que é a queimadura no coração dos Apóstolos em Emmaus, e a queimadura no coração de Wesley, naquela noite de 24 de Maio. Porque Deus é fogo, David, e é-o de tal maneira que o horror da sua não presença ainda se exprime por meio de fogo, de fogo negro...
- Que é que tu dizes?- perguntou David. - Falas como um iluminado."
Julien Green, Moïra, trad. António de Sousa, Lisboa: Editora Ulisseia, 1973, p. 232.
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