Monday, April 15, 2024

ARVOREZINHA

 




"Vejo-a, mesmo quando distraidamente passo por ela. Não foge, fica muito quieta, não consegue pensar, não consegue desejar seja o que for, não, limita-se a crescer, a estar no espaço e a ter folhas que ninguém toca e que se limitam a ser vistas. Diante da sombra que ela projecta passam a correr os apressados.
      Nunca te dei nada? Mas ela não precisa de felicidade. Talvez ela fique contente se alguém a achar bonita. Acham que sim? Quantas inocências sagradas falam através dela. Não se sabe de nada, apenas está ali para o meu bel-prazer. Nunca me vê sorrir à saudação que a própria me lança inadvertidamente.
     Por que razão não pode ela estimar o meu amor, quando lhe digo algo de bom, apesar de ela nada dizer em troca? Morrer aos pés deste ser, como que pintado por Courbet, que se despede para sempre!
     Mas se eu irei sobreviver, o que será de ti?"



Robert Walser, Cinza, Agulha, Lápis e Fosforozitos, trad. e seleç. Ricardo Gil Soeiro, Lisboa: Assírio & Alvim, 2023, p. 85.

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