"É opaca a palavra dos anjos, e imóvel
o sorriso que brinda seus lábios entreabertos.
Uma nuvem solícita, um lívido relâmpago
lhes coroa a cabeça adolescente.
Seu riso não perturba, seu olhar não deslumbra,
seu corpo não é mais do que o leito das águas.
O aroma que bebem, o perfume que pisam
não deixa mais sinais do que a legenda, o nome.
O ar que eles respiram é sagrado, é tecido
de silenciosos fios, metálicos anéis.
Despida, a sua carne insexual e frágil
causa pavor aos homens e o pasmo às mulheres.
As mães, essas nocturnas vestes sacrificadas
aos primeiros vestidos, aos laços no cabelo,
não reconhecem neles os filhos destinados
a obter de Deus a permissão do eterno."
(...)
Raul de Carvalho, Lâmpadas Acesas para Aumentar o Dia, selec. e apresentação de Diogo Martins, Lisboa: Língua Morta, 2020, p. 78.
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